Prova do - FAPEC (2018) - Questões Comentadas

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O intertexto é um componente de grande relevância no processo de produção de textos, pois os discursos não surgem do nada, mas apoiam-se em outro(s) em relação ao(s) qual(is) tomam posição. Com base nesse conceito e considerando as relações entre os textos 1, 2 e 3, assinale a alternativa correta:

  • A O texto 1 evoca os demais, porém seu conteúdo é conflitante com ambos, pois estes tratam do Brasil como um todo, com foco em suas paisagens edênicas, enquanto aquele faz referência a apenas um lugar e de perspectiva completamente diferente, puramente política.
  • B O autor do texto 1 inscreve seu texto em um campo já conhecido do leitor: reutiliza materiais já escritos, com os quais dialoga ironicamente, desconstruindo o discurso ufanista que caracteriza os textos 2 e 3 e adotando um posicionamento puramente comercial.
  • C Como o texto 1 foi escrito em 2003, momento em que o Brasil já não é mais a terra da igualdade, mas da injustiça social e de privilégios para as elites, a relação entre os três textos torna-se polêmica.
  • D O texto 1 relaciona-se explicitamente com os textos 2 e 3, ambos anteriores a ele, porém numa relação de subversão: limitando-se a valorizar o ecoturismo, apresenta um espaço descaracterizado culturalmente, distante daquele Brasil representado nos textos 2 e 3.
  • E Ao evocar, no título, os textos 2 e 3, o autor do texto 1 incorpora-os por imitação, porém reatualiza seu sentido e sua temática de exaltação de elementos nacionais, focalizando especificamente uma prática ainda desconhecida no século XIX, o ecoturismo.

Sobre as sequências tipológicas em que se estruturam os textos 1, 2 e 3, é correto afirmar que:

  • A No texto 2, predominam sequências dialogais e instrucionais.
  • B No texto 1, predominam sequências descritivas e informativas.
  • C No texto 3, predominam sequências narrativas e informativas.
  • D Nos textos 2 e 3, predominam sequências dialogais e narrativas.
  • E Nos textos 1 e 3, predominam sequências injuntivas e descritivas.

Ainda em observância à norma culta, assinale a alternativa em que NÃO há problema de coesão nem erro de pontuação:

  • A Pelos serviços que presta à humanidade, a ONU continua essencial, mas especialistas em política internacional apontam que a entidade funciona como espelho do mundo; ou seja: não funciona se a comunidade internacional está desunida.
  • B Pelos serviços que presta à humanidade a ONU, continua essencial, mas, especialistas em política internacional, apontam que a entidade funciona como espelho do mundo. Ou seja, não funciona se a comunidade internacional está desunida.
  • C Pelos serviços, que presta à humanidade, a ONU continua essencial, onde especialistas em política internacional apontam que, a entidade funciona como espelho do mundo. Ou seja: não funciona, se a comunidade internacional, está desunida.
  • D A ação puramente racional, leva-nos à ruína, a saída é a adoção de soluções morais, incentivar à cooperação e punir o egoísmo, e não técnicas. O que, só é possível, por meio de uma autoridade.
  • E A ação puramente racional, leva-nos à ruína. A saída, é a adoção de soluções morais (incentivar à cooperação e punir o egoísmo), e não técnicas, onde só é possível por meio de uma autoridade.

Leia o texto a seguir.

Hum? Eh-eh... É. Nhor sim. Ã-hã, quer entrar, pode entrar... Hum, hum. Mecê sabia que eu moro aqui? Como é que sabia? Hum-hum... Eh. Nhor não, n’t, n’t... Cavalo seu é esse só? Ixe. Cavalo tá manco, aguado. Presta mais não. Axi... Pois sim. Hum, hum. Mecê enxergou este foguinho meu, de longe? É. A’pois. Mecê entra, cê pode ficar aqui.

Hã-hã. Isto não é casa... É. Havéra. Acho. Sou fazendeiro não, sou morador... Eh, também sou morador não. Eu – toda a parte. Tou aqui, quando eu quero eu mudo. Aqui eu durmo. Hum. Nhém? Mecê é que tá falando. Nhor não... Cê vai indo ou vem vindo?

Hã, pode trazer tudo pra dentro. Erê Mecê desarreia cavalo, eu ajudo. Mecê peia cavalo, eu ajudo... Traz alforje pra dentro, traz saco, seus dobros. Hum, hum Pode. Mecê cipriuara, homem que veio pra mim, visita minha; iá-nhã? Bom. Bonito. Cê pode sentar, pode deitar no jirau. Jirau é meu não. Eu – rede. Durmo em rede. Jirau é do preto. Agora eu vou ficar agachado. Também é bom. Assopro o fogo. Nhem? Se essa é minha, nhem? Minha é a rede. Hum. Hum-hum. É. Nhor não. Hum, hum... Então, por que é que cê não quer abrir saco, mexer no que tá lá dentro dele? Atié Mecê é lobo gordo... Atié... É meu, algum? Que é que eu tenho com isso? Eu tomo suas coisas não, furto não. A-hé, a-hé, nhor sim, eu quero. Eu gosto. Pode botar no coité. Eu gosto demais...

ROSA, João Guimarães. Meu tio o Iauaretê. In.: ______. Estas histórias. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2001, p. 191. (Fragmento)

O conto “Meu tio o Iauaretê” é considerado um dos momentos primorosos da concepção de estilo do escritor João Guimarães Rosa. A partir do fragmento que dá início ao conto, é correto afirmar que:

  • A Como já é de conhecimento no senso comum, são empregados pelo escritor inúmeros neologismos, como “jirau”, “aguado” e “coité”, presentes no fragmento apresentado.
  • B É notável que houve um trabalho estilístico, na medida em que são imperceptíveis as escolhas fonéticas, morfológicas ou sintáticas que diferenciam a linguagem empregada no trecho em questão da norma padrão do português brasileiro.
  • C O narrador expressa-se em primeira pessoa e o fragmento do conto dá a entender que se trata de um diálogo, como se pode perceber por marcas do registro oral tal qual “Hum?”, “Eheh” e “n’t n’t”, que buscam representar sons da fala. No entanto, apesar de perceber que o narrador está conversando com alguém (“Mecê é que tá falando. [...] Cê vai indo ou vem vindo?”), o leitor não tem acesso às falas do interlocutor.
  • D A utilização de termos como “hã-hã”, “hum-hum”, “erê”, “Axi” ou “a-hé” não tem função na linguagem fora do contexto literário, visto que tais expressões não são encontradas na língua falada e referem-se, exclusivamente, a criações do escritor com fins puramente estéticos
  • E Os caracteres telegráficos, perceptíveis por meio do emprego de frases curtas e intercaladas, coadunados ao uso excessivo de expressões que buscam representar a fala, denotam o emprego de uma linguagem tipicamente jornalística, própria da experiência profissional do escritor.

Leia o texto seguir.

Você tem treze anos. Os membros crescem em uma relação díspar, como se estivessem competindo entre si, mas fossem muito diferentes nas competências que os fazem avançar. Os pés crescem mais rápido que as próprias pernas; o nariz dispara com larga vantagem em relação ao resto dos demais elementos que constituem a face; os braços se alongam de uma maneira que faz o tronco parecer pequeno demais para os anexos que carrega. Aqui e ali, pelos começam a surgir sem um padrão aparentemente definido: pernas, braços, axilas. A sombra de uma barba começa a se pronunciar timidamente. Na barriga, um rastilho de pólvora. Com treze anos, talvez você pense em garotas. Talvez você pense em garotos. Talvez você não saiba muito bem o que pensar ou, até mesmo, pensar seja a última coisa que você cogite quando o assunto são garotas. Ou garotos. Talvez seus pés enormes e desproporcionais ainda não estejam crescidos o suficiente para chegar do outro lado da linha. O lado que você tem convicção de certas coisas, o lado em que você já avançou o suficiente para não sentir falta daquilo que precisa deixar para trás ou para se sentir atraído por tudo aquilo que está por vir. Talvez você ainda não tenha avançado o suficiente, mesmo com seus pés enormes, para saber o que é a língua de uma garota, ou de um garoto, operando movimentos circulares e molhados dentro da sua boca. Vagando por essa área nebulosa em que você já não é mais exatamente o que era, mas também não é plenamente o que pode vir a ser [...].

TIMM, André. Modos inacabados de morrer. Rio de Janeiro: Oito e meio, 2016, p. 13. (Fragmento)


O romance Modos inacabados de morrer (2016), do gaúcho, radicado em Santa Catarina, André Timm, destaca-se no cenário da literatura brasileira, tendo sido finalista do Prêmio São Paulo de Literatura em 2017. Com base no fragmento apresentado, é INCORRETO afirmar que:

  • A O fragmento apresenta, do ponto de vista temático, dúvidas próprias de uma fase da vida, a adolescência, em que aspectos ligados ao desenvolvimento do corpo, do caráter e da personalidade do indivíduo são questionados, dado o período de transição entre a infância e a maturidade.
  • B O fragmento apresenta, ao lançar mão do recurso da enumeração, as impressões sobre a modificação do corpo; ora sob o viés da desproporcionalidade entre os membros superiores e inferiores, ora apresentando uma gradação sobre o surgimento de pelos: “pernas, braços e axilas”, “sombra de uma barba”, “na barriga, um rastilho de pólvora”, como que na tentativa de conferir ordem ao caos das transformações.
  • C O emprego de pronomes como “aqui” e “ali”, de advérbios como “talvez” e “aparentemente” e de formas verbais condicionais como “se estivessem” e “fossem” acaba por criar, juntamente com os demais elementos descritivos empregados, um efeito de realismo e clareza em que o narrador se expressa sem margem para a subjetividade.
  • D O uso da segunda pessoa do discurso pode causar o efeito de aproximação do leitor com a situação narrada. À medida que a narrativa progride, o uso reiterado do pronome “você” pode agir no sentido de posicionar o leitor no lugar desse “tu” a que o narrador se dirige
  • E Dentre os questionamentos apresentados no fragmento, dois apresentam-se como relevantes, devido ao fato de serem retomados: a desproporção do tamanho dos pés, repetida em “talvez seus pés enormes” e “mesmo com seus pés enormes”, e a dúvida sobre a sexualidade, repetida em “quando o assunto são garotas. Ou garotos” e “para saber o que é a língua de uma garota, ou de um garoto”