Inicialmente, as Convenções da Organização Internacional do Trabalho de 1919 também foram marcos importantes na proteção das crianças e adolescentes, na medida em que trouxeram regras protetivas em decorrência da exploração de crianças durante a Revolução Industrial. Foi proibido, por exemplo, o trabalho noturno por crianças, além da previsão de idade mínima para o trabalho na indústria.
No contexto do pós-Primeira Guerra Mundial, foi criada a Organização Internacional Salve as Crianças, com o objetivo de cuidar e abrigar crianças vítimas da guerra. Foi criada em 1919, na Inglaterra, e existe até os dias atuais. Em seguida, no sentido de proporcionar uma proteção especial às crianças e adolescentes, veio a Convenção de Genebra, de 1924, também conhecida como Carta da Liga das Nações sobre a criança. Corroborando essa norma, sobreveio a Declaração Universal de Direitos Humanos das Nações Unidas, de 1948, que repetiu a evocação do “direito a cuidados e assistência especiais” da população infanto-juvenil.
Atualmente, contamos com inúmeros tratados e convenções protetivos dos direitos das crianças e adolescentes, dentre os quais podemos citar: Declaração Universal dos Direitos Humanos; Declaração dos Direitos das Crianças; Declaração mundial sobre a sobrevivência, a proteção e o desenvolvimento das crianças nos anos; Convenção americana sobre direitos humanos – Pacto de San José da Costa Rica; Diretrizes das Nações Unidas para a prevenção da delinquência juvenil – Diretrizes de Riad; Regras mínimas das Nações Unidas para proteção dos jovens privados de liberdade; e o Pacto internacional dos direitos civis e políticos. Além disso, temos: 10 Regras mínimas de Beijing; X Cúpula Ibero-americana de Chefes de Estado e de governo – Declaração do Panamá; “Unidos pela infância e adolescência, base da justiça e da equidade no novo milênio”; Convenção Internacional sobre os aspectos civis do sequestro internacional de crianças etc.
Caso Mary Ellen Wilson
Primeiro caso documentado de abuso infantil e maus-tratos no âmbito familiar. Trata-se da triste história de Mary Ellen Wilson, criança adotada que nitidamente sofria de maus-tratos, sendo acorrentada em sua própria casa e castigada física e psicologicamente com frequência.
O caso ocorreu em Nova York nos idos de 1874. Mary Ellen nasceu em 1864, filha de Frances e Thomas Wilson. Seu pai foi morto na Guerra Civil, e sua mãe, que precisou começar a trabalhar para seguir sua vida, tomou a decisão de entregar sua filha ao Departamento de Caridade da cidade de Nova York. A menina foi adotada por Mary McCormack e Francis Connolly, cujos maus-tratos infligidos à menina foram inacreditáveis, nitidamente percebidos pela vizinhança. Segundo relatos da época, a menina foi obrigada a trabalhar duramente, sendo reiteradamente espancada, queimada, cortada e trancada no armário durante dias.
Um vizinho, o missionário metodista, Etta Angell Wheeler, conseguiu verificar in loco as condições de Mary Ellen, constatando que a menina estava desnutrida e descalça em pleno inverno, além de apresentar vários cortes e queimaduras pelo corpo.
Assim, ele acionou as autoridades buscando conter os abusos, tendo sido informado a respeito da ausência de normativos legais protetivos das crianças, que não forneciam base legal para que a menina fosse retirada compulsoriamente da família. Inconformado com a situação, Wheeler descobriu a Sociedade Americana de prevenção da crueldade aos animais (American Society for the Prevention of Cruelty to Animals), contando com a ajuda de um advogado daquela instituição. Assim, os pais adotivos foram levados a julgamento com base em leis de proteção aos animais.
Após a decisão, Mary Ellen foi retirada da família Connolly e permaneceu sob a custódia de Etta Wheeler. Quando adulta, casou-se, teve dois filhos biológicos, adotou três de um casamento anterior de seu esposo, Lewis Schutt, além de uma outra jovem órfã. Faleceu aos 92 anos de idade.
A partir desse célebre caso, foram inúmeros avanços legislativos na proteção das crianças e adolescentes. Todavia, infelizmente, os casos de abuso infantil se mostram assustadoramente grandes até os dias atuais.
Convenção de Genebra
Após esses acontecimentos, no sentido de proporcionar uma proteção especial a crianças e adolescentes, veio a Convenção de Genebra, de 1924, também conhecida como Carta da Liga das Nações sobre a Criança, ou Declaração de Genebra dos Direitos da Criança. Foi o primeiro documento especificamente voltado à proteção da criança, composto de cinco itens que reconheciam a vulnerabilidade das crianças; contudo, elas ainda eram consideradas apenas objeto de proteção, e não sujeitos de direitos especiais, como ocorre nos dias atuais.
Como a Convenção de Genebra não era vinculante, havia possibilidade apenas de sanções para os casos de descumprimento.
Declaração dos Direitos da Criança de 1959
Surgida após a Declaração Universal dos Direitos Humanos, reforçou a proteção presente nela, especificamente a ideia de vulnerabilidade da criança. Adotou, em âmbito internacional, a teoria da proteção integral, passando a entender as crianças e adolescentes como sujeitos de direitos.
É interessante mencionar que o Brasil, embora já ciente da adoção da teoria da proteção integral, editou internamente o Código de Menores em 1979, que tratava o menor como delinquente, objeto de proteção e não sujeito de direitos. A Declaração trouxe 10 princípios, mas sem caráter coercitivo.
Convenção sobre os Direitos da Criança de 1989
As discussões que culminaram na edição dessa convenção iniciaram-se no ano internacional da criança, 1979, culminado na aprovação da convenção dez anos mais tarde. Vejamos os seus principais pontos de destaque:
acolhe a doutrina da proteção integral;
reconhece a absoluta prioridade no tratamento das questões envolvendo crianças;
reconhece o superior interesse da criança, baliza mestra de todas as questões envolvendo os infantes.
Diretrizes das Nações Unidas para a Prevenção da Delinquência Infantil − Diretrizes de RIAD
São as diretrizes das Nações Unidas que buscam evitar a prática de ilícitos penais por crianças. Vejamos:
PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS
1. A prevenção da delinquência juvenil é parte essencial da prevenção do delito na sociedade. Dedicados a atividades lícitas e socialmente úteis, orientados rumo à sociedade e considerando a vida com critérios humanistas, os jovens podem desenvolver atitudes não criminais.
2. Para ter êxito, a prevenção da delinquência juvenil requer, por parte de toda a sociedade, esforços que garantam um desenvolvimento harmônico dos adolescentes e que respeitem e promovam a sua personalidade a partir da primeira infância.
3. Na aplicação das presentes Diretrizes, os programas preventivos devem estar centralizados no bem-estar dos jovens desde sua primeira infância, de acordo com os ordenamentos jurídicos nacionais.
4. É necessário que se reconheça a importância da aplicação de políticas e medidas progressistas de prevenção da delinquência que evitem criminalizar e penalizar a criança por uma conduta que não cause grandes prejuízos ao seu desenvolvimento e que nem prejudique os demais.
5. Devem ser desenvolvidos serviços e programas com base na comunidade para a prevenção da delinquência juvenil. Só em último caso recorrer-se-á a organismos mais formais de controle social.
Regras de Beijing
São regras mínimas das Nações Unidas para a administração da justiça da infância e da juventude, que tratam da criação e normatização da justiça especializada da infância e juventude.
Regras de Tóquio
São as regras mínimas das Nações Unidas para os jovens privados de liberdade, que buscam a aplicação de medidas alternativas à prisão.
Regras de Havana
Trata-se de regras mínimas da ONU para a proteção dos menores privados de liberdade.