Dispõe o art. 109 que os princípios gerais do Direito Privado não podem ser utilizados para a dispensa das consequências da obrigação tributária, servindo apenas como instrumento de pesquisa.
Ademais, o CTN, por meio de seu art. 108, comete o inconveniente vezo de estatuir regras gerais de interpretação aplicáveis a esse ramo. Continua o mestre em sua manifestação de inconformismo, declinando sobre o fato de o legislador conferir inaceitável privilégio à analogia, ao dispô-la em posição cronologicamente superior aos princípios de Direito Tributário e de Direito Público. Menciona o doutrinador que o legislador ainda se esqueceu dos princípios gerais do Direito Privado e dos costumes, estes contemplados pelo art. 140 do CPC de 2015).
Assim, com a chamada consignada, passamos às ponderações dos institutos estampados nos incisos I a IV do art. 108 do CTN.
Analogia é a integração da lei por meio de comparação com casos similares, análogos. Desse modo, não existindo norma expressa que regule uma determinada situação, pode-se aplicar, por analogia, regra prevista para outra situação, semelhante à primeira. Existe uma restrição, contudo, para esse procedimento, segundo o CTN (art. 108, 1º): o emprego da analogia não poderá resultar na exigência de tributo não previsto em lei.
Como vimos, a analogia não é interpretação, e sim integração. Na interpretação com o auxílio da analogia, fica patente que: o caso não está compreendido no quadro da lei, mas se pretende que deve ser tratado como se estivesse, por ser concretamente análogo.
Princípios gerais de Direito Tributário são os princípios estudados no capítulo constitucional que dispõe sobre o sistema tributário nacional, tratando, entre outros, dos princípios da estrita legalidade, da indelegabilidade da competência tributária, da tipicidade da tributação, da não cumulatividade do ICMS e do IPI, entre outros. São os mandamentos constitucionais de índole tributária que iluminam o campo da tributação.
Princípio gerais de Direito Público são regras diretoras que presidem o sistema, as quais exprimem antessuposto impreterível para a compreensão de qualquer segmento de nosso Direito. Podemos relacionar os seguintes, entre outros: federativo, republicano, legalidade, igualdade, irretroatividade das leis, universalidade da jurisdição, ampla defesa, devido processo legal, indisponibilidade do interesse público, supremacia do interesse público sobre o particular.
Não obstante a omissão do dispositivo em estudo em relação aos princípios gerais de Direito, estes não podem ser esquecidos. O clássico enunciado de que pacta sunt servanda está, por exemplo, na base da construção jurisprudencial que acabou consagrada pelo próprio Código Tributário Nacional, quando, no art. 178, reconheceu a não revogabilidade das isenções condicionadas concedidas por prazo certo.
O princípio da boa-fé é aplicável em diversas situações, de que é exemplo o processo da consulta fiscal, por meio do qual o indivíduo expõe sua situação à autoridade administrativa e, enquanto não obtiver a resposta, fica ao abrigo de qualquer procedimento fiscal que possa questionar sua conduta na matéria que, de boa-fé, trouxe a consideração do fisco; ela é protegida ainda pelo art. 100, § único, do Código Tributário Nacional.
Equidade, por seu turno, hospeda o abrandamento do rigor da lei. Por tal critério, também chamado de justiça do caso concreto, o aplicador da lei leva em conta os aspectos peculiares de cada caso, norteando-se pelo seu senso geral de justiça.
Na verdade, a equidade denota conotação penetrada de certo subjetivismo e preordena-se em suavizar os rigores da lei em obséquio aos ideais de ética e justiça. O seu emprego no Direito Tributário, cumpre observar, não pode render margem à dispensa do pagamento do tributo devido, regra esta expressa no art. 108, § 2º, do CTN.
O art. 109 assinala os princípios gerais de Direito Privado, os quais são utilizados para pesquisa da definição, do conteúdo e do alcance de seus institutos, conceitos e formas, mas não para definição dos respectivos efeitos tributários. É o caso, por exemplo, da compensação, que tanto no Direito Civil como no Direito Tributário representa fórmula extintiva da obrigação em virtude de duas pessoas serem credoras e devedoras entre si. Conquanto o conceito seja comum, o Direito Tributário estabeleceu efeitos dessemelhantes ao instituto, máxime porque, nesse plano, a compensação não se opera ipso jure, como ocorre no Direito Civil, uma vez que depende de previsão legal expressa.
Já o art. 110 versa sobre a hipótese em que o Direito Tributário não pode alterar a fisionomia de institutos de Direito Privado para o fim de criar ou limitar competência tributária. Traduz exemplo do dispositivo a vedação de a lei tributária considerar o automóvel um bem imóvel para efeito de estabelecer a incidência do imposto sobre a transmissão de bens imóveis.
Nesse preceito, parece-nos que o assunto está mal posicionado, inserido entre regras de interpretação do Direito Tributário, pois, com efeito, não contempla preceito a esse respeito; trata-se de comando dirigido ao legislador, não ao intérprete, uma vez que cuida de explicitar, em suma, que aquele não pode expandir o campo de competência tributária que lhe foi atribuído mediante artifício de ampliar a definição, o conteúdo ou o alcance de institutos de Direito Privado.