O movimento antropofágico foi uma manifestação artística e literária da década de 1920, idealizada pelo escritor Oswald de Andrade, sendo considerado uma das correntes de vanguarda na primeira fase do Modernismo no Brasil.
O uso do termo “antropofágico” está associado a palavra “antropofagia”, que se refere ao ato de comer a carne humana, chamado de canibalismo entre os humanos. Historicamente, essa palavra está ligada aos atos ritualísticos no sentido de que, ao comer a carne de um outro homem, seria adquirida dele importantes características.
Mas, no que diz respeito ao movimento, essa palavra foi usada no sentido de assimilar uma cultura estrangeira, porém sem copiá-la, ou seja, usar apenas as influências da cultura estrangeira para a formação de uma cultura com aspectos nacionais.
Essa foi a ideia principal de Oswald de Andrade com o início do manifesto antropofágico ou antropófago. Nesse sentido, a palavra está relacionada à "deglutinação" dos estilos e modelos internacionais para o desenvolvimento de algo totalmente novo e com a cara do Brasil, eliminando, sobretudo, o eurocentrismo da arte.
Se você ainda tem dúvida sobre a comparação metafórica entre a expressão e o movimento, assista o vídeo abaixo:
Origem do movimento antropofágico
O movimento antropofágico teve como principais líderes: Tarsila do Amaral e o seu marido Oswald de Andrade. A ideia da manifestação nasceu na Europa, influenciada pelo Manifesto Futurista, do italiano Felippo Tomaso Marinetti.
Na cidade de Paris, o combate ao academicismo representado no compromisso de Marinetti com a literatura e a nova civilização técnica encantou e propôs ideias ao escritor brasileiro, Oswald de Andrade, de como iniciar o movimento antropofágico no Brasil.
O lançamento do movimento antropofágico no Brasil aconteceu por meio do “manifesto antropófago”
, publicado por Andrade na revista Antropofagia do estado de São Paulo, em 1928. O trecho dizia o seguinte:
“Só a Antropofagia nos une. Socialmente. Economicamente. Filosoficamente. Única lei do mundo. Expressão mascarada de todos os individualismos, de todos os coletivismos. De todas as religiões. De todos os tratados de paz. Tupi, or not tupi that is the question. Contra todas as catequeses. E contra a mãe dos Gracos. Só me interessa o que não é meu. Lei do homem. Lei do antropófago.”
A revista citada passou por duas edições. A primeira fase foi editada entre maio de 1928 e fevereiro de 1929, já a segunda passou por esse processo do dia 17 de março a 1 de agosto de 1929.
Características
É possível perceber que a linguagem usada pelo movimento antropofágico é uma linguagem metafórica, com fragmentos poéticos de bom humor. Essa característica influenciou outras áreas, como a pintura e a escultura.
No decorrer do manifesto, o escritor brasileiro apoiou-se em diversas teorias de pensadores e autores do mundo todo, a exemplo de Freud, Rousseau, Hermann Keyserling, Marx, dentre outros.
Com isso, o movimento, associado as ideias dos autores e a própria ideologia de Oswald de Andrade, uniu diversas culturas, como as indígenas, a africana e a cultura latina, formada pela colonização europeia.
Para o autor Oswald de Andrade, o movimento antropofágico representou no modernismo brasileiro um verdadeiro “divisor de águas”, não apenas pelo ato de conscientização, a chamada “descida antropofágica”, que significou o deslocamento do objeto estético na fase do Pau-Brasil, mas também pelas opiniões divergentes que provocaram grandes desentendimentos com os modernistas.
De maneira geral, o caráter assistemático e o estilo telegráfico, usados pelo autor para dar forma ao movimento antropofágico, contribuíram, de certo modo, para a ocorrência de uma série de mal-entendidos.
Dentro do modernismo brasileiro, o movimento antropofágico foi o mais consequente, pois ele fixou uma identidade cultural com reflexos na música brasileira, a exemplo da Bossa Nova e o Tropicalismo. Juntos, eles configuram dois casos típicos de concretização dos ideais de “deglutição” e “devoração crítica”, ambos propostos por Andrade.
O símbolo do movimento antropofágico no Brasil foi o quadro Abaporu (1928), de Tarsila do Amaral, que foi entregue de presente para o seu marido e também idealizador do movimento: Oswald de Andrade.
A antropofagia, além da pintura, continuou influenciando outros segmentos, como o livro “Cobra Norato” de Raul Bopp, as músicas que já foram citadas, e uma obra originalmente brasileira, desenvolvida por Villa-Lobos: “As Bachianas Brasileiras”.
Modernismo no Brasil
Como o movimento citado nasceu dentro do modernismo brasileiro, é importante lembrar alguns pontos que marcaram a passagem desse período artístico no país. Primeiro, a Semana de Arte Moderna, que aconteceu em 1922, no estado de São Paulo, representou o marco inicial do Modernismo no Brasil.
No evento, os artistas modernos se mostraram contra o parnasianismo vigente da época, que cultivava uma poesia formal. A intenção deles era propor algo radical na linguagem e nos formatos artísticos, diferente dos padrões encontrados na arte tradicional.
Empolgados com as inovações que tiveram a oportunidade de conhecer durante as viagens para a Europa, eles romperam com as regras preestabelecidas na cultura. Durante a Semana de Arte Moderna, eles apresentam quadros, obras literárias, e recitaram poemas inspirados em outros movimentos da vanguarda europeia, a exemplo do dadaísmo, futurismo, expressionismo, surrealismo, etc.
Além de Oswald de Andrade, os artistas que mais se destacaram durante a primeira fase do Modernismo no Brasil foram: Alcântara Machado, Mário de Andrade, Manuel Bandeira, Menotti del Picchia, Raul Bopp, Guilherme de Almeida e Ronald de Carvalho.
A primeira geração do Modernismo no Brasil também se destacou com o lançamento de quatro movimentos culturais. Foram eles:
- Pau-Brasil: movimento que defendia a criação de uma poesia primitivista, baseada na revisão crítica de um passado histórico e cultural, aceitação e valorização de riquezas;
- Antropofagia: Embora o termo esteja associado aos rituais antropofágicos dos índios brasileiros, onde eles devoram seus inimigos para lhes extrair força, o escritor Oswald de Andrade propôs a devoração simbólica de um cultura, sem perder a identidade da cultura nacional;
Contudo, contrários às ideias disseminadas por essas tendências, outros dois movimentos, chamados: o Verde-Amarelismo e o Anta apoiavam um nacionalismo ufanista. Ambos representavam diferentes tendências ideológicas, com formas distintas de expressar o nacionalismo.
A segunda fase, por sua vez, encontrou uma forma mais definida de expressar a arte, respeitando a liberdade e os elementos nacionais, porém deixando um pouco de lado os excesso do experimentalismo da Semana de Arte Moderna.