Canções que questionavam o regime autoritário
As músicas da ditadura militar expressavam o descontentamento dos artistas com as barbáries cometidas durante esse período da história brasileira. E assim como as peças de teatro, filmes, poesias e outras obras elaboradas nesse período, a produção musical estava susceptível à censura por parte dos militares. Por isso, muitas vezes, os compositores precisavam lançar mão de algumas estratégias para que pudessem manifestar seu questionamento à ordem posta.
Desse modo, é possível que você já tenha escutado algumas das músicas da ditadura militar e não tenha percebido as referências feitas ao momento político em que foi composta. Em processos seletivos, como o Enem e o vestibular, esse conhecimento é importante, sobretudo, nas questões de interpretação de texto. Se você sente que teria dificuldade para resolver questões dessa natureza, não se preocupe. Neste artigo, vamos apresentar algumas das músicas da ditadura militar e refletir sobre os significados nas letras.
O que foi a ditadura?
Antes de conhecermos algumas músicas da ditadura militar, é importante relembrarmos o que foi esse momento da história brasileira. Com isso, fica mais fácil entender porque a sociedade em geral, e em particular os artistas, se opunham ao regime e à configuração política e social imposta pelos governantes durante os 20 anos em que o sistema ditatorial se manteve vigente.
A ditadura militar no Brasil teve início no ano de 1964, quando o presidente João Goulart sofreu um golpe e foi retirado do governo. Com a deposição do presidente eleito, os militares assumiram o governo e deram início a um período de autoritarismo e repressão que só seria findado em 1985.
O golpe sofrido por João Goulart foi orquestrado pelos militares, mas teve apoio de civis, em especial do empresariado, e dos Estados Unidos. Jango, como era conhecido, tinha um projeto político que prezava o desenvolvimentismo e a promoção do bem-estar social. Por isso, era visto como uma ameaça comunista no Brasil. Vale lembrar que, no contexto mundial, havia a disputa entre o socialismo e o capitalismo encabeçada pelos Estados Unidos e União Soviética.
Durante a ditadura, quem se opunha ao regime era considerado um inimigo da nação e estava susceptível às prisões deflagradas de maneira arbitrária, cassações, tortura e execução. Por conta disso, muitos opositores precisaram de exílio político, dentre eles os compositores e intérpretes de algumas das músicas da ditadura militar.
Como os compositores conseguiam lançar suas obras?
Durante a ditadura, as produções artísticas, intelectuais e culturais estavam susceptíveis à censura. Com isso, o compositor precisava apresentar a letra de sua composição ao representante do governo que diria se a obra poderia ou não ser lançada. E, diante dos perigos que se corria ao fazer críticas diretas ao regime, os compositores de músicas da ditadura militar começaram a usar das figuras de linguagem como estratégia para conseguir autorização para gravar, tocar e distribuir suas músicas.
As metáforas possibilitavam que os artistas expressassem suas opiniões acerca do contexto vivido sem colocar em risco sua obra. A utilização dessa e de outras figuras de linguagem, contudo, não era consenso entre todos os artistas - alguns optaram por denunciar as barbaridades do regime militar de forma objetiva e direta – e, a partir de dado momento, elas passaram a ser insuficientes para garantir a aprovação das obras.
Um compositor de músicas da ditadura militar que passou por isso foi Chico Buarque. Após ter a canção “Apesar de Você” proibida de ser executada, a censura passou a exercer uma vigilância mais incisiva às suas produções e tudo o que era assinado pelo compositor era vetado. Diante desse cenário, a medida adotada por Chico foi a criação de um heterônimo, um nome personagem que assinaria suas letras. Foi aí que nasceu o compositor Julinho de Adelaide.
Algumas músicas da ditadura militar
Todo o contexto de repressão e autoritarismo que foi a ditadura no Brasil impossibilitou que muitas canções que se opunham ao regime chegassem ao conhecimento público. Mas aquelas que conhecemos nos dias atuais ajudam a recontar esse período da história nacional. Conheça algumas!
Apesar de você
Essa composição de Chico Buarque recebeu aval da ditadura para lançamento porque o compositor fez o censor acreditar que se tratava de uma canção sobre o término de uma relação. Contudo, a música fazia referência ao fim da ditadura, em especial, no verso “Amanhã vai ser outro dia”. Após o lançamento, a canção fez muito sucesso e, ao perceberem, que ela era utilizada nos protestos contra o regime, os militares tentaram censurá-la, mas ela já havia se popularizado, se tornando uma das músicas da ditadura militar mais famosa.
Cálice
Composição de Chico Buarque e Gilberto Gil, a questão central dessa música é o cerceamento da liberdade de expressão. Fazendo referência aos textos bíblicos, os compositores trazem a súplica feita por Jesus Cristo por saber que seria morto e torturado. Ela serve de denúncia às mortes causadas pela ditadura, responsável pelo derramamento de muito sangue. No refrão, a paronomásia existente entre os sons de cálice e cale-se evidencia um pedido de que o silenciamento promovido pela ditadura militar termine.
O bêbado e a equilibrista
Escrita por Aldir Blanc e João Bosco, a música faz referência a alguns fatos ocorridos durante a ditadura que não foram devidamente explicados, como a queda do elevado Paulo de Frontin e o assassinato do jornalista Vladimir Herzog. Esses eventos são trazidos nos versos “Caía a tarde feito um viaduto" e "Choram Marias e Clarices" (Clarice Herzog era o nome da esposa do jornalista do Vladimir).
Pra não dizer que não falei das flores
Composta por Geraldo Vandré, essa canção fala sobre as desigualdades sociais existentes durante o período de ditadura, critica a presença de oficiais de exércitos nas ruas e convoca as pessoas a lutarem contra o regime ditatorial.