A Lei nº 10.048/2000 trata sobre a prioridade de atendimento à pessoa com deficiência, assim como idosos, gestantes, lactantes, pessoas acompanhadas de crianças de colo e obesos.
A Lei revela que pessoas com deficiência, idosos com idade igual ou superior a 60 anos, gestantes, lactantes, pessoas com crianças de colo e obesos terão atendimento prioritário (art. 1º).
As repartições públicas e empresas concessionárias de serviços públicos estão obrigadas a dispensar atendimento prioritário, por meio de serviços individualizados que assegurem tratamento diferenciado e atendimento imediato às pessoas supracitadas (art. 2º).
Além disso, as empresas públicas de transporte e as concessionárias de transporte coletivo deverão reservar assentos devidamente identificados aos idosos, gestantes, lactantes, pessoas com deficiência e pessoas acompanhadas por crianças de colo (art. 3º).
Ainda, “os logradouros e sanitários públicos, bem como os edifícios de uso público, terão normas de construção, para efeito de licenciamento da respectiva edificação, baixadas pela autoridade competente, destinadas a facilitar o acesso e uso desses locais pelas pessoas portadoras de deficiência” (art. 4º, Lei nº 10.048/2000).
Por fim, de acordo com o art. 5º da lei em comento, os veículos de transporte coletivo a serem produzidos após 12 meses da publicação da Lei serão planejados de forma a facilitar o acesso a seu interior pelas pessoas com deficiência.
Quanto aos veículos de transporte coletivo já em utilização, a Lei estabelece que os seus proprietários gozarão do prazo de 180 dias, a contar da regulamentação da Lei, para efetuar as adaptações necessárias ao acesso pelas pessoas com deficiência (§ 2º, art. 5º).
Cumpre destacar que, caso haja infração a alguma disposição da Lei nº 10.048/2000, os responsáveis estarão sujeitos às penalidades previstas em legislação específica caso seja servidor ou chefia responsável por repartição pública.
Em se tratando de instituições financeiras, estarão sujeitas a penalidades específicas.
Vejamos, a seguir, um caso concreto envolvendo a Lei nº 10.048/2000 como fundamento:
As instituições financeiras devem utilizar o sistema Braille na confecção dos contratos bancários de adesão e todos os demais documentos fundamentais para a relação de consumo estabelecida com indivíduo portador de deficiência visual (STJ, 3ª Turma, REsp. nº 1.315.822/RJ, rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 24.03.2015. Informativo nº 559 – grifos nossos).
No caso, as instituições financeiras, ao relutarem a utilizar o método Braille nos contratos bancários de adesão firmados com pessoas com deficiência visual, posicionam-se de maneira discriminatória, afrontando, portanto, a dignidade desse grupo. Os fundamentos legais quanto a essa questão são os seguintes, e podem ser encontrados no link <https://www.dizerodireito.com.br/2015/05/bancos-tem-o-dever-de-fornecer-contrato.html>.
A Lei nº 4.169/1962, em seu art. 1º oficializa as convenções Braille para uso na escrita e leitura dos cegos.
Art. 1º São oficializadas e de uso obrigatório em todo o território nacional, as convenções Braille, para uso na escrita e leitura dos cegos e o Código de Contrações e Abreviaturas Braille, constantes da tabela anexa e aprovados pelo Congresso Brasileiro Pró-Abreviatura Braille, realizado no Instituto Benjamin Constant, na cidade do Rio de Janeiro, em dezembro de 1957.
O Decreto nº 6.949/2009 promulga a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, assinados em Nova York, em 30 de março de 2007, cujo texto tem valor equivalente ao de uma emenda constitucional, e, por veicular direitos e garantias fundamentais do indivíduo, tem aplicação concreta e imediata (art. 5º, §§ 1º e 3º, da Constituição Federal – CF/1988). A convenção impôs aos Estados signatários a obrigação de assegurar às pessoas com deficiência o exercício pleno e equitativo de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais, conferindo-lhes tratamento materialmente igualitário (diferenciado na proporção de sua desigualdade), acessibilidade física, de comunicação e informação, além de inclusão social, autonomia e independência.
Especificamente sobre a barreira da comunicação, a Convenção faz menção, em diversos dispositivos, ao método Braille, determinando que ele seja incentivado como forma de propiciar às pessoas com deficiência visual o efetivo acesso às informações.
Lei nº 8.078/1990 (Código de Defesa do Consumidor – CDC) – A utilização do método Braille nos contratos bancários com pessoas com deficiência visual encontra fundamento, ainda, no CDC, que preconiza ser direito básico do consumidor o fornecimento de informação suficientemente adequada e clara do produto ou serviço oferecido, encargo a ser observado não apenas por ocasião da celebração do contrato, mas também durante todas as fases, inclusive as pré-contratuais.
No caso do consumidor com deficiência visual, a consecução desse direito somente é alcançada por meio da utilização do método Braille, que viabiliza a integral compreensão das cláusulas contratuais submetidas à sua apreciação, especialmente aquelas que impliquem limitações de direito, assim como dos extratos mensais, dando conta dos serviços prestados, taxas cobradas, dentre outros.
Ainda envolvendo instituições financeiras, uma delas foi condenada a pagar R$ 1.000,00 de indenização por negar atendimento prioritário a um cliente com paralisia. A 3ª Turma Recursal dos Juizados Especiais do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT) (Processo nº 2015.10.1.004168-3) confirmou sentença do 2º Juizado Especial Cível e Criminal de Santa Maria, que condenou o Banco Bradesco a indenizar consumidor que teve atendimento prioritário recusado, mesmo portando documento que comprovava o fato.
A Lei nº 10.098/2000, por sua vez, estabelece normas e critérios para promover a acessibilidade das pessoas com deficiência ou com mobilidade reduzida.
De acordo com a lei, acessibilidade significa dar a essas pessoas condições para alcançarem e utilizarem, com segurança e autonomia, os espaços, mobiliários e equipamentos urbanos, as edificações, os transportes e os sistemas e meios de comunicação.
Para isso, a lei prevê a eliminação de barreiras e obstáculos que limitem ou impeçam o acesso, a liberdade de movimento e a circulação com segurança dessas pessoas.
Vejamos:
Art. 2º (...)
I – acessibilidade: possibilidade e condição de alcance para utilização, com segurança e autonomia, de espaços, mobiliários, equipamentos urbanos, edificações, transportes, informação e comunicação, inclusive seus sistemas e tecnologias, bem como de outros serviços e instalações abertos ao público, de uso público ou privados de uso coletivo, tanto na zona urbana como na rural, por pessoa com deficiência ou com mobilidade reduzida; (...). (Grifo nosso).
O dispositivo supracitado se encontra em consonância com o Título III, Capítulo I, da Lei nº 13.146/2015 (arts. 53 a 62), que trata de maneira mais específica a acessibilidade da pessoa com deficiência.
II – barreiras: qualquer entrave, obstáculo, atitude ou comportamento que limite ou impeça a participação social da pessoa, bem como o gozo, a fruição e o exercício de seus direitos à acessibilidade, à liberdade de movimento e de expressão, à comunicação, ao acesso à informação, à compreensão, à circulação com segurança, entre outros, classificados em:
a) barreiras urbanísticas: as existentes nas vias e nos espaços públicos e privados abertos ao público ou de uso coletivo;
b) barreiras arquitetônicas: as existentes nos edifícios públicos e privados;
c) barreiras nos transportes: as existentes nos sistemas e meios de transportes;
d) barreiras nas comunicações e na informação: qualquer entrave, obstáculo, atitude ou comportamento que dificulte ou impossibilite a expressão ou o recebimento de mensagens e de informações por intermédio de sistemas de comunicação e de tecnologia da informação; (...) (Grifos nossos).
Além dessas espécies de barreiras, a Lei nº 13.146/2015 prevê as barreiras atitudinais, consistentes no comportamento ou atitude que impeça ou prejudique a participação social da pessoa com deficiência em igualdade de condições e oportunidades com as demais pessoas, e tecnológicas, entendidas como aquelas que dificultam ou impedem o acesso da pessoa com deficiência às tecnologias disponíveis.
As disposições trazidas nos arts. 3º a 7º da Lei nº 10.098/2000 limitam-se a estipular diretrizes sobre a acessibilidade nas vias e nos espaços públicos, sem qualquer especificação que não permita o detalhamento pelo legislador local, determinando somente limites e normas técnicas mínimas que devem ser observados em tais espaços.
Há, apenas, o estabelecimento da obrigatoriedade de que as vias e os espaços públicos sejam acessíveis, com a observância, em alguns casos, das normas técnicas padronizadas da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), o que de forma alguma obsta eventual regulação estadual ou distrital, que tem, ainda, amplo campo de especificação.
Dando continuidade, a Lei nº 10.098/2000, em seu art. 3º, dispõe que o planejamento e a urbanização das vias públicas, dos parques e dos demais espaços de uso público deverão ser concebidos e executados de forma a torná-los acessíveis para todas as pessoas, inclusive para aquelas com deficiência ou com mobilidade reduzida. Os que já existem, assim como suas instalações de serviços e mobiliários urbanos, deverão ser adaptados para promover a acessibilidade dessas pessoas.
Os parques de diversões, por exemplo, devem adaptar, no mínimo, cinco por cento de cada brinquedo e equipamento e identificá-lo para possibilitar sua utilização por pessoas com deficiência ou com mobilidade reduzida, desde que isso seja tecnicamente possível (art. 4º, parágrafo único).
Ainda, os banheiros em parques, praças, jardins e espaços livres públicos deverão ser acessíveis e dispor, pelo menos, de um sanitário e um lavatório para atender às pessoas com deficiência (art. 6º).
Além disso, “em todas as áreas de estacionamento de veículos, localizadas em vias ou em espaços públicos, deverão ser reservadas vagas próximas dos acessos de circulação de pedestres, devidamente sinalizadas, para veículos que transportem pessoas portadoras de deficiência com dificuldade de locomoção”.
Essas vagas deverão ser em número equivalente a dois por cento do total oferecido e deve ser garantida, no mínimo, uma vaga (art. 7º).
De acordo com a legislação, “os sinais de tráfego, semáforos, postes de iluminação ou quaisquer outros elementos verticais de sinalização que devam ser instalados em itinerário ou espaço de acesso para pedestres deverão ser dispostos de forma a não dificultar ou impedir a circulação, e de modo que possam ser utilizados com a máxima comodidade” (art. 8º).
Os semáforos para pedestres instalados nas vias públicas perigosas e com intenso fluxo de veículos deverão emitir sinal sonoro suave, intermitente e sem estridência, que sirva de guia ou orientação para a travessia de pessoas com deficiência visual (art. 9º).
Na sequência, o art. 10 da Lei nº 10.098/2000, por sua vez, traz disposição que apenas impõe o dever de projetar-se e instalar-se os elementos de mobiliário urbano de forma a garantir a acessibilidade, deixando toda a regulamentação para o legislador local. Assim, trata-se, de fato, de norma geral.
Ademais, “a construção, ampliação ou reforma de edifícios públicos ou privados destinados ao uso coletivo deverão ser executadas de modo que sejam ou se tornem acessíveis às pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida” (art. 11).
Neles, deverão ser observados, pelo menos, os seguintes requisitos de acessibilidade:
Art. 11. (...)
I – nas áreas destinadas a garagem e estacionamento de uso público, deverão ser reservadas vagas próximas dos acessos de circulação de pedestres, devidamente sinalizadas, para veículos que transportem pessoas com deficiência que tenham dificuldade de locomoção permanente;
II – pelo menos um dos acessos ao interior do edifício deverá estar livre de barreiras arquitetônicas e de obstáculos que impeçam ou dificultem a acessibilidade de pessoa com deficiência ou com mobilidade reduzida;
III – pelo menos um dos itinerários que comuniquem horizontal e verticalmente todas as dependências e serviços do edifício, entre si e com o exterior, deverá cumprir os requisitos de acessibilidade;
IV – os edifícios deverão dispor, pelo menos, de um banheiro acessível, com equipamentos e acessórios que possam ser utilizados por pessoa com deficiência ou com mobilidade reduzida.
O art. 12 traz disposição genérica, determinando a obrigatoriedade de acessibilidade em relação aos locais de eventos públicos, observando as regras da ABNT, de modo a facilitar as condições de acesso, circulação e comunicação.
Assim, as salas de aulas, espetáculos e conferências deverão ter espaços reservados para pessoas que utilizam cadeira de rodas e lugares específicos para aquelas com deficiência auditiva e visual, inclusive para seus acompanhantes, de modo a facilitar-lhes as condições de acesso, circulação e comunicação.
Na sequência, os seus arts. 13 e 14 trazem também disposições gerais, relativas à obrigatoriedade de acessibilidade nos edifícios nos quais haja elevadores, dispondo acerca dos requisitos mínimos de acessibilidade, deixando a regulamentação também a cargo do legislador local. Trata-se, novamente, de um mínimo, sem o qual não restaria proteção nenhuma ao direito tutelado.
Ainda, o órgão federal responsável pela coordenação da política habitacional deverá reservar um percentual mínimo do total das habitações para o atendimento da demanda de pessoas com deficiência ou com mobilidade reduzida (art. 15).
Importante também ressaltar que, para garantir o direito das pessoas com deficiência sensorial e com dificuldade de comunicação ao acesso à informação, à comunicação, ao trabalho, à educação, ao transporte, à cultura, ao esporte e ao lazer, o Poder Público deve promover a eliminação de barreiras na comunicação e estabelecer alternativas técnicas que tornem acessíveis os sistemas de comunicação e sinalização (art. 17).
Para isso, formará profissionais intérpretes de escrita em Braille e linguagem de sinais (art. 18). Os serviços de radiodifusão sonora e de sons e imagens adotarão plano de medidas técnicas com o objetivo de permitir o uso da linguagem de sinais ou outra subtitulação para garantir o direito de acesso à informação às pessoas com deficiência auditiva (art. 19).
Por fim, “os veículos de transporte coletivo deverão cumprir os requisitos de acessibilidade estabelecidos nas normas técnicas específicas” (art. 16).
Nota-se que a acessibilidade para a pessoa com deficiência é essencial, sendo seu direito viver ou circular em um ambiente em que seja possível desenvolver suas habilidades sem depender de terceiros, desenvolvendo, portanto, sua autonomia e independência.
Cabe ao Estado garantir o bem-estar das pessoas com deficiência, principalmente por meio da formulação e implantação de políticas públicas, formuladas não somente pelo poder público, como também pela sociedade civil e por aqueles que enfrentam as adversidades de viver em uma comunidade sem infraestrutura.
Cumpre destacar que o Superior Tribunal de Justiça (STJ), no ano de 2017, entendeu como inegável a existência do interesse de agir do Ministério Público Federal (MPF) em demanda que tratava da acessibilidade de pessoas com deficiência a prédios públicos ou particulares destinados à coleta de votos. No acórdão, é expressa a posição jurisprudencial no sentido de ser plenamente cabível a ação civil pública que objetiva obrigação de fazer a fim de garantir acessibilidade nos prédios públicos ou privados às pessoas com deficiência (AgInt no REsp. nº 1.563.459/SE – Inteiro teor no material de jurisprudência).
Outro caso envolve decisão que determinou que a Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) realizasse obras em todos os seus prédios para torná-los acessíveis às pessoas com necessidades especiais ou com dificuldades de locomoção. O ministro relator Herman Benjamin revelou que a teoria da reserva do possível é inaplicável ao caso, pois a universidade conta, desde 2000, com dotação orçamentária específica para a adaptação de edifícios. De acordo com o magistrado, após mais de uma década com esse tipo de verba, a administração pública não pode se valer do argumento da reserva do possível para se eximir de um dever legal – no caso, a oferta de prédios públicos acessíveis a todos (STJ, REsp. nº 1.607.472/PE – REsp. nº 2016/0155431-8, rel. min. HERMAN BENJAMIN, T2 – 2ª Turma, data do julgamento 15.09.2016, data da publicação 11.10.2016 – inteiro teor no material de jurisprudência).
A partir do que foi exposto, é possível notar a importância das leis mencionadas, em especial da Lei da Acessibilidade que, em sua essência, traz disposições de suma importância. Contudo, na prática, observa-se que ainda há um longo caminho a percorrer para que os direitos das pessoas com deficiência sejam definitivamente efetivados.