A personificação ou prosopopeia, como também é conhecida, é uma das figuras de linguagem categorizadas como figuras de pensamento e bastante utilizada na literatura.
Ela usa das características dos seres humanos para atribuir sentimentos, qualidades e ações a seres irracionais, objetos inanimados, plantas, animais, etc.
O que é personificação?
A personificação, assim como as demais figuras de linguagem, se utiliza do sentido conotativo, isto é, se apoia na subjetividade.
Usada tanto na linguagem oral quanto na linguagem escrita, essa figura de linguagem se caracteriza pelo aumento da emissão da mensagem através de sentimentos, criando, assim, um universo abstrato e poético.
Ela é bastante utilizada na literatura infanto-juvenil, especialmente nas fábulas. Também é muito usada na linguagem cotidiana, em expressões já conhecidas como: “a vida é cruel”, “a cidade pede socorro”, “carnaval pede passagem”, etc.
Considerada uma figura de linguagem de pensamento, a personificação se utiliza dos significados escondidos, implícitos. É um recurso que possibilita que todos os seres tenham voz, sensações e emoções.
A personificação pode ser vista ainda em filmes, séries ou programas de televisão, por exemplo. Isso acontece quando vemos uma figura inanimada, como um objeto ou móvel, ou um animal, ganhar vida e falar.
Exemplos de personificação
- “A Cadeira começou a gritar com a Mesa.”
A cadeira assume comportamento humano, que nesse caso é gritar. - “O morro dos ventos uivantes.”
Significa que os ventos de tão fortes uivam, atribuindo ao vento o comportamento de um lobo. - “O Sol amanheceu triste e escondido.”
O dia pode estar no nublado e assumiu uma característica humana de estar triste. - “O Sol Sorriu para a lua.”
Dá a ideia de que o dia foi feliz. Que o dia bom ganha a capacidade de sorrir para a noite. - “O fogo dançava com o vento.”
Significa que o vento aumenta as chamas do fogo, dando a ideia de que os dois dançam juntos. - “O vento assobiava na janela, durante a noite.”
O vento não assobia, logo, a ideia interpretada nessa frase é que o vento era forte o som dele ecoava nas frestas da janela. - “O sol brilhava contente na manhã seguinte.”
Significa que o dia amanheceu feliz. O dia recebeu a sensação humana de felicidade. - “O carro não aguentava mais, tantos anos de trabalho.”
O carro não trabalha como humanos, mas a frase expressa que o automóvel, assim como as pessoas, estava velho e exausto por conta do tempo. - “As nuvens andavam lentamente, esperando a chegada do irritado trovão.”
Essa expressão significa que as nuvens, de maneira poética, aguardam a chegada do trovão. - “O passarinho, furioso com a convencida arara, disse que ia embora.”
O passarinho assume um comportamento humano de raiva. Entende-se que ele brigou com a arara e por isso disse que ia embora.
Personificação na literatura
Na literatura, como dito acima, a personificação é muito utilizada.
A poesia é um dos gêneros literários que usa bastante a personificação, e essa é uma das razões para tantos apreciadores dos textos líricos. Observe abaixo autores que utilizam desse recurso:
Um exemplo clássico de personificação presente na literatura brasileira é a obra “Vidas Secas”, de Graciliano Ramos. Durante o capítulo intitulado “Baleia” em que ocorre a narração de sua morte, o autor concede a cachorra traços tipicamente humanos. Ela sofre como os donos no sertão e é caracterizada pelo escritor como um membro da família. Veja no trecho abaixo:
“Não se lembrava de Fabiano. Tinha havido um desastre, mas Baleia não atribuía a esse desastre a impotência em que se achava nem percebia que estava livre de responsabilidades. Uma angústia apertou-lhe o pequeno coração. Precisava vigiar as cabras: àquela hora cheiros de suçuarana deviam andar pelas ribanceiras, rondar as moitas afastadas.”
(RAMOS, 1992, p. 89)
Outro autor que utiliza a personificação é Vinícius de Morais em sua poesia intitulada “Borboletas”. Observe os versos:
“Brancas
Azuis
Amarelas
E pretas
Brincam
Na luz
As belas
Borboletas.
Borboletas brancas
São alegres e francas.
Borboletas azuis
Gostam muito de luz.
As amarelinhas
São tão bonitinhas!
E as pretas, então…
Oh, que escuridão!”
O poeta concede às borboletas a ato de brincar, além de atribuir sentimentos de alegria e sinceridade.
Abaixo um poema de Carlos Drummond de Andrade, intitulado “Congresso Internacional do Medo”, que também aborda em seu conteúdo a presença da personificação.
“Provisoriamente não cantaremos o amor,
que se refugiou mais abaixo dos subterrâneos.
Cantaremos o medo, que esteriliza os abraços,
não cantaremos o ódio, porque esse não existe,
existe apenas o medo, nosso pai e nosso companheiro.”
O poeta, no último trecho, atribuiu ao medo a figura de um pai, transformando ele em um companheiro.
Observe o poema “Recordação” da escritora Cecília Meireles que também utiliza a personificação.
“Agora, o cheiro áspero das flores
leva-me os olhos por dentro de suas pétalas.
Eram assim teus cabelos;
tuas pestanas eram assim, finas e curvas.
As pedras limosas, por onde a tarde ia aderindo,
tinham a mesma exalação de água secreta,
de talos molhados, de pólen,
de sepulcro e de ressurreição.
E as borboletas sem voz
dançavam assim veludosamente.
Restitui-te na minha memória, por dentro das flores!
Deixa virem teus olhos, como besouros de ônix,
tua boca de malmequer orvalhado,
e aquelas tuas mãos dos inconsoláveis mistérios,
com suas estrelas e cruzes,
e muitas coisas tão estranhamente escritas
nas suas nervuras nítidas de folha,
– e incompreensíveis, incompreensíveis.”
A autora personifica a borboleta no trecho: “E as borboletas sem voz dançavam assim veludosamente”, atribuindo características e ações próprias do ser humano como estar sem voz e dançar.
Personificação na música
A personificação é uma figura de linguagem que também é encontrada em músicas. Veja nos trechos abaixo:
“(…)
Aprendi o segredo, o segredo
O segredo da vida
Vendo as pedras que choram sozinhas
No mesmo lugar …”
A música “Medo da Chuva”, de Raul Seixas, deu vida a um ser inanimado que no caso é a pedra.
No trecho “vendo as pedras que choram sozinhas”, o compositor atribui à pedra a sensação de choro, característica de um ser humano.
O cantor e compositor Chico Buarque de Holanda utiliza dessa figura de linguagem na canção “A banda”. Veja abaixo:
“(…)
A moça triste que vivia calada sorriu
A rosa triste que vivia fechada se abriu
E a meninada toda se assanhou
Pra ver a banda passar
Cantando coisas de amor…”
Nesse trecho Chico Buarque confere à rosa o sentimento de tristeza.