A Constituição Federal, em seu art. 227, § 1º, inciso II, estabelece a promoção pelo Estado de programas de prevenção e atendimento especializado para pessoas com deficiência física, sensorial ou mental.
Art. 227, § 1º O Estado promoverá programas de assistência integral à saúde da criança, do adolescente e do jovem, admitida a participação de entidades não governamentais, mediante políticas específicas e obedecendo aos seguintes preceitos:
II – criação de programas de prevenção e atendimento especializado para as pessoas portadoras de deficiência física, sensorial ou mental, bem como de integração social do adolescente e do jovem portador de deficiência, mediante o treinamento para o trabalho e a convivência, e a facilitação do acesso aos bens e serviços coletivos, com a eliminação de obstáculos arquitetônicos e de todas as formas de discriminação. (Grifos nossos.)
Em obediência ao comando constitucional, veio a Lei nº 10.216/2001, tratando sobre a proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais. A lei também redireciona o modelo assistencial de saúde mental, prevendo, especialmente, as hipóteses de internação voluntária e involuntária de doentes mentais com necessidades de tratamentos curativos.
Competência
No tangente às competências constitucionalmente distribuídas, compete a todos os entes, concorrentemente, legislarem sobre a proteção e integração social das pessoas deficientes. Portanto, à União caberão as normas gerais, podendo ser complementadas no que couber pelos estados, DF e municípios, nos termos do art. 24 da CF/1988.
Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre:
XIV – proteção e integração social das pessoas portadoras de deficiência. (Grifo nosso.)
A seu turno, a execução dos cuidados com as pessoas deficientes é comum a todos os entes federados (União, estados, DF e municípios), conforme prescrito no art. 23 da Constituição Federal.
Art. 23, CF/1988. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios:
II – cuidar da saúde e assistência pública, da proteção e garantia das pessoas portadoras de deficiência. (Grifo nosso.)
Nessa senda, a União estabeleceu a Lei nº 10.216/2001, prescrevendo a normativa geral a respeito da internação e, em especial, do tratamento curativo das pessoas com deficiência mental.
Ainda, em consonância ao princípio da igualdade e isonomia, a lei prevê expressamente a não discriminação por quaisquer motivos das pessoas acometidas de transtornos mentais, como verificamos no art. reproduzido a seguir:
Art. 1º Os direitos e a proteção das pessoas acometidas de transtorno mental, de que trata esta Lei, são assegurados sem qualquer forma de discriminação quanto à raça, cor, sexo, orientação sexual, religião, opção política, nacionalidade, idade, família, recursos econômicos e ao grau de gravidade ou tempo de evolução de seu transtorno, ou qualquer outra. (Grifos nossos.)
Direitos dos portadores de transtornos mentais
O atendimento na área de saúde mental, de qualquer natureza, deverá ser prestado de acordo com parâmetros previamente estabelecidos na Lei nº 10.216/01, com cientificação necessária ao paciente e seus familiares a respeito desses direitos, conforme artigo 2º.
Art. 2º Nos atendimentos em saúde mental, de qualquer natureza, a pessoa e seus familiares ou responsáveis serão formalmente cientificados dos direitos enumerados no parágrafo único deste artigo. (Grifos nossos.)
Em síntese, o paciente terá os seguintes direitos, não excluídos outros deles decorrentes, já que se trata de rol exemplificativo (numerus apertus):
a) acesso ao melhor tratamento dispensado pelo SUS, de acordo com suas necessidades;
b) tratamento humanizado e respeitoso, visando sua recuperação pela inserção familiar, no trabalho e comunidade;
c) proteção contra abuso e exploração;
d) sigilo de serviços prestados;
e) presença médica a qualquer tempo, especialmente para esclarecê-lo a respeito da necessidade de internação involuntária;
f) livre acesso aos meios de comunicação;
g) recebimento de informações;
h) tratamento pelos meios menos invasivos possíveis;
i) tratamento, preferencialmente, em serviços comunitários.
Consentimento
Considerando a nova sistemática, explicitada pela Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência, a Lei nº 13.146/2015, que a deficiência, ainda que mental, não subtrai, por si só, a capacidade civil da pessoa, o consentimento prévio, livre e esclarecido do paciente. Este ainda se faz necessário, nos termos do art. 12 da referida lei.
Art. 12. O consentimento prévio, livre e esclarecido da pessoa com deficiência é indispensável para a realização de tratamento, procedimento, hospitalização e pesquisa científica.
§ 1º Em caso de pessoa com deficiência em situação de curatela, deve ser assegurada sua participação, no maior grau possível, para a obtenção de consentimento.
Internação
É importante atentar-se que, em regra, não deverá haver internação da pessoa com deficiência mental.
Art. 4º A internação, em qualquer de suas modalidades, só será indicada quando os recursos extra hospitalares se mostrarem insuficientes.
Assim, a institucionalização é cabível apenas em último caso, desde que exauridas todas as tentativas de tratamento extra ambulatorial, em hipóteses de risco à própria pessoa, expressamente prescrita por um médico.
Art. 6º A internação psiquiátrica somente será realizada mediante laudo médico circunstanciado que caracterize os seus motivos. (Grifos nossos.)
Outrossim, a lei deixa entrever a finalidade principal de reinserção do deficiente mental em seu meio social.
Art. 2º, II – ser tratada com humanidade e respeito e no interesse exclusivo de beneficiar sua saúde, visando alcançar sua recuperação pela inserção na família, no trabalho e na comunidade;
IX – ser tratada, preferencialmente, em serviços comunitários de saúde mental.
Art. 4º, § 1º O tratamento visará, como finalidade permanente, a reinserção social do paciente em seu meio. (Grifos nossos.)
Dentre as principais características da internação psiquiátrica, podemos destacar:
a) indicação como última medida;
b) finalidade permanente – reinserção do paciente em seu meio; oferecimento de assistência integral (serviços médicos, assistência social, psicólogos, lazer e outros);
c) é expressamente vedada a internação em instituição com características asilares; pacientes internados há longo tempo, em situação de grave dependência institucional, serão alvo de política específica de alta planejada e reabilitação psicossocial assistida, sendo responsável a autoridade sanitária (artigo 5º);
d) sempre ocorrerá mediante laudo médico circunstanciado e motivado;
e) o médico deverá possuir registro no CRM do estado onde se localiza o estabelecimento.
f) evasão, transferência, acidente, intercorrência clínica grave e falecimento serão comunicados pela direção aos familiares ou representante legal, assim como à autoridade sanitária, no prazo máximo de 24 horas.
Tipos de internação psiquiátrica
De acordo com o art. 6º da lei, há três tipos de internação: voluntária, involuntária, compulsória.
Voluntária – Ocorre a pedido do paciente ou, ao menos, com o seu consentimento. Nesse caso, a solicitação ou consentimento deve se dar de forma expressa, com assinatura do paciente no momento de sua admissão, além de uma declaração de que optou por esse regime de tratamento.
Involuntária – Ocorre sem o consentimento do paciente, sempre a pedido de terceiro.
Compulsória – Ocorre por expressa determinação judicial. Nesse caso, o juiz competente levará em conta as condições de segurança do estabelecimento, quanto à salvaguarda do paciente, dos demais internados e funcionários.
Desinternação
Voluntária – No caso de internação voluntária, a desinternação poderá ocorrer por dois motivos: a pedido do paciente, por meio de solicitação escrita, ou por determinação médica.
Involuntária – Dar-se-á por solicitação escrita do familiar ou responsável legal, ou por determinação médica.
Comunicação ao Ministério Público
É importante atentar-se ao estabelecido no art. 8º, § 1º – a notificação deve ocorrer dentro do prazo de 72 horas.
§ 1º A internação psiquiátrica involuntária deverá, no prazo de setenta e duas horas, ser comunicada ao Ministério Público Estadual pelo responsável técnico do estabelecimento no qual tenha ocorrido, devendo esse mesmo procedimento ser adotado quando da respectiva alta. (Grifos nossos.)
Pesquisas Científicas
Art. 11 da Lei nº 10.216/2001.
Art. 11. Pesquisas científicas para fins diagnósticos ou terapêuticos não poderão ser realizadas sem o consentimento expresso do paciente, ou de seu representante legal, e sem a devida comunicação aos conselhos profissionais competentes e ao Conselho Nacional de Saúde.
Art. 12, § 2º, do Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146/2015).
§ 2º A pesquisa científica envolvendo pessoa com deficiência em situação de tutela ou de curatela deve ser realizada, em caráter excepcional, apenas quando houver indícios de benefício direto para sua saúde ou para a saúde de outras pessoas com deficiência e desde que não haja outra opção de pesquisa de eficácia comparável com participantes não tutelados ou curatelados.