A progressão de regime encontra-se disciplinada no art. 112 da Lei de Execuções Penais (LEP), que sofreu profunda alteração pela Lei nº 13.964/2019.
Segundo Avena (2018, p. 240), três são os sistemas clássicos que objetivam disciplinar a progressão de regime de cumprimento da pena privativa de liberdade: sistema da Filadélfia ou Pensilvânico ––baseia-se no isolamento; sistema de Auburn –– o condenado, em absoluto silêncio, trabalha durante o dia com outros presos e sujeita-se ao isolamento no período noturno; e o sistema progressivo –– há um período inicial de isolamento absoluto, após, segue-se a fase em que o apenado trabalha durante o dia na companhia de outros presos e no estágio final, é colocado em liberdade condicional.
O Brasil adota o sistema progressivo, em que há mudança de regime, passando o condenado do regime mais severo para o menos rigoroso; é o que se depreende dado art. 33, § 2º, do Código Penal (CP) e do art. 112 da LEPLEP.
Art. 33, Código Penal (...)
§ 2º –– As penas privativas de liberdade deverão ser executadas em forma progressiva, segundo o mérito do condenado, observados os seguintes critérios e ressalvadas as hipóteses de transferência a regime mais rigoroso;
A LEPLEP estabelece a necessidade de classificação do condenado para que possa haver a progressão, institui estabelecimentos penais distintos para cumprimento da pena privativa de liberdade (penitenciária, colônia penal e casa do albergado) segundo o regime no qual se encontra o preso e estabelece o exame do mérito do apenado como condicionante para o deferimento da progressão de regime.
A progressão do regime prisional fundamenta-se na necessidade de individualização da execução e tem por fim assegurar a reinserção do apenado na sociedade. Para a concessão do benefício, exige o art. 112, caput, da LEP o atendimento a requisitos cumulativos: requisitos objetivos, profundamente alterados pelo Pacote Anticrime – Lei nº 13.964/2019, que criou uma variedade de lapsos temporais a serem observados antes da permissão do benefício; e o requisito subjetivo: :bom comportamento carcerário durante a execução da pena privativa de liberdade.
Progressão de regime fechado para o semiaberto
São requisitos para essa progressão:
– Condenação
Deve existir condenação ainda que pendente recurso sem efeito suspensivo. Segundo a Súmula nº 716 do Supremo Tribunal Federal ((STF): Admite-se a progressão de regime de cumprimento de pena ou a aplicação imediata de regime menos gravoso nela determinada, antes do trânsito em julgado da sentença condenatória.
– Cumprimento de parcela da pena
O condenado para progredir de regime deve cumprir parcela da pena no regime mais rigoroso; o prazo varia conforme a natureza do delito e as condições pessoais do beneficiário.
Aqui reside as maiores alterações trazidas pela Lei nº 13.964/2019 para o art. 112 da LEP:
Art. 112. A pena privativa de liberdade será executada em forma progressiva com a transferência para regime menos rigoroso, a ser determinada pelo juiz, quando o preso tiver cumprido ao menos: (Redação dada pela Lei nº 13.964, de 2019.)
I –– 16% (dezesseis por cento) da pena, se o apenado for primário e o crime tiver sido cometido sem violência à pessoa ou grave ameaça; (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019.)
II –– 20% (vinte por cento) da pena, se o apenado for reincidente em crime cometido sem violência à pessoa ou grave ameaça; (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019.)
III –– 25% (vinte e cinco por cento) da pena, se o apenado for primário e o crime tiver sido cometido com violência à pessoa ou grave ameaça; (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019.)
IV –– 30% (trinta por cento) da pena, se o apenado for reincidente em crime cometido com violência à pessoa ou grave ameaça; (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019.)
V –– 40% (quarenta por cento) da pena, se o apenado for condenado pela prática de crime hediondo ou equiparado, se for primário; (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019.)
VI –– 50% (cinquenta por cento) da pena, se o apenado for: (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019.)
a) condenado pela prática de crime hediondo ou equiparado, com resultado morte, se for primário, vedado o livramento condicional; (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019.)
b) condenado por exercer o comando, individual ou coletivo, de organização criminosa estruturada para a prática de crime hediondo ou equiparado; ou (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019.)
c) condenado pela prática do crime de constituição de milícia privada; (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019.)
VII –– 60% (sessenta por cento) da pena, se o apenado for reincidente na prática de crime hediondo ou equiparado; (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019.)
VIII –– 70% (setenta por cento) da pena, se o apenado for reincidente em crime hediondo ou equiparado com resultado morte, vedado o livramento condicional. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019.)
Antes da alteração legislativa, o prazo de 1/6 era o prazo regra, aplicável a todos os delitos, exceto para os crimes hediondos ou equiparados, em que se aplicam os prazos de 2/5 ou 3/5, ou, ainda, para as condenações envolvendo crimes cometidos por gestantes, mães ou responsáveis por crianças ou pessoas com deficiência, em que o prazo aplicado é de 1/8.
Com a modificação inserida pelo Pacote Anticrime, o cumprimento de 16% (1/6) da pena passa a ser observado apenas na progressão de regime para apenados primários que tenham cometido crimes sem violência ou grave ameaça a pessoa; se reincidente, o prazo passa a 20% (1/5).
O lapso temporal também foi estendido aos apenados primários que cometeram crimes com violência ou grave ameaça a pessoa, que antes seguiam a regra geral de 1/6 e agora devem cumprir 25% (1/4) da pena para progredirem para um regime menos severo; se reincidente, o prazo passa para 30%.
Com relação ao condenado por crime hediondo ou equiparado, no caso de agente primário, a nova lei manteve o lapso temporal do cumprimento de 40% (2/5) da pena no regime anterior; também foi mantido o prazo do reincidente, que considera o lapso de 60% (3/5) previsto na Lei dos Crimes Hediondos.
Foram acriadas novas hipóteses em relação aos condenados primários pelo cometimento de crimes hediondos ou equiparados, mas qualificados pela morte; aqui, tem que ser cumprido 50% da pena no regime anterior para que o apenado possa progredir para regime menos gravoso e, nesse caso, ainda é vedada a concessão do livramento condicional, se o condenado for reincidente, o lapso temporal passa a 70% da pena, sendo o prazo mais rigoroso previsto na nova legislação para progredir.
Com relação à necessidade de cumprimento de 50% da pena do regime anterior, foram acrescidas também as hipóteses dos condenados por exercer o comando de organização criminosa de forma individual ou coletiva para prática de crimes hediondos ou equiparados, e condenados pelo crime de constituição de milícia privada.
– Bom comportamento carcerário durante a execução
Decorre da ausência de registro de faltas disciplinares no prontuário do apenado, devendo ser atestado pela administração prisional, conforme art. 112, § 1º, da LEP: § 1º Em todos os casos, o apenado só terá direito à progressão de regime se ostentar boa conduta carcerária, comprovada pelo diretor do estabelecimento, respeitadas as normas que vedam a progressão. (Redação dada pela Lei nº 13.964, de 2019.)
– Oitiva do Ministério Público e da defesa
O art. 112, § 2º, da LEP passou a exigir que a decisão judicial no incidente de progressão seja motivada e precedida de manifestação do Ministério Público e da defesa do condenado.
§ 2º A decisão do juiz que determinar a progressão de regime será sempre motivada e precedida de manifestação do Ministério Público e do defensor, procedimento que também será adotado na concessão de livramento condicional, indulto e comutação de penas, respeitados os prazos previstos nas normas vigentes. (Redação dada pela Lei nº 13.964, de 2019.)
Segundo Marcão (2019, p. 157), a progressão de regime prisional, desde que satisfeitos os requisitos legais, constitui um direito público subjetivo do sentenciado. Integra-se ao rol dos direitos materiais penais.
Com relação à progressão de regime em crimes hediondos ou equiparados, a redação original do art. 2º, § 1º, da Lei nº 8.072/1990 estabelecia que a pena privativa de liberdade imposta pela prática de crime hediondo ou equiparado deveria ser cumprida integralmente em regime fechado. No entanto, após inúmeras divergências doutrinárias e jurisprudenciais, foi editada a Lei nº 11.464/2007 que alterou a Lei dos Crimes Hediondos, estabelecendo que os condenados pelos crimes nela previstos apenas iniciarão o cumprimento da pena em regime fechado (art. 2º, § 1º, da Lei dos Crimes Hediondos), mas que, para efeitos de progressão de regime, deverão cumprir tempo mínimo de pena superior ao exigido dos condenados por outros delitos, isto é, 2/5 de pena, se primários, e 3/5, se reincidentes.
Pagamento da multa cumulativamente imposta –– requisito para progressão de regime
Cunha (2020, p. 184) observa que o STF vem decidindo que o inadimplemento deliberado da pena de multa cumulativamente aplicada ao sentenciado impede a progressão, salvo se comprovada a absoluta impossibilidade econômica do apenado em pagar o valor, ainda que parceladamente. Além disso, o condenado por crime contra a Administração Pública terá a progressão de regime de cumprimento de pena condicionada a mais um requisito objetivo, qual seja, a reparação do dano que causou, ou a devolução do produto do ilícito praticado, com os acréscimos legais.
Progressão por salto
O condenado que cumpre pena no regime fechado não pode progredir diretamente para o regime aberto; esse é, inclusive, o entendimento da Súmula nº 491 do Superior Tribunal de Justiça ((STJ).
O Ministério Público deve ser ouvido previamente antes da apreciação do pedido de progressão pelo juízo, sob pena de nulidade absoluta da decisão.
O cometimento de falta grave interrompe a contagem do prazo para a progressão de regime de cumprimento de pena, o qual se reinicia a partir do cometimento dessa infração, conforme entendimento da Súmula nº 534 do STJ.
Progressão para o regime semiaberto e aberto
Para a progressão do regime semiaberto para o aberto, além dos requisitos subjetivos e objetivos genéricos, a LEP exige que sejam observadas as condições e pressupostos dos arts. 113, 114 e 115.
Art. 113. O ingresso do condenado em regime aberto supõe a aceitação de seu programa e das condições impostas pelo Juiz.
Art. 114. Somente poderá ingressar no regime aberto o condenado que:
I –– estiver trabalhando ou comprovar a possibilidade de fazê-lo imediatamente;
II –– apresentar, pelos seus antecedentes ou pelo resultado dos exames a que foi submetido, fundados indícios de que irá ajustar-se, com autodisciplina e senso de responsabilidade, ao novo regime.
Parágrafo único. Poderão ser dispensadas do trabalho as pessoas referidas no artigo 117 desta Lei.
Art. 115. O Juiz poderá estabelecer condições especiais para a concessão de regime aberto, sem prejuízo das seguintes condições gerais e obrigatórias:
I –– permanecer no local que for designado, durante o repouso e nos dias de folga;
II – sair para o trabalho e retornar, nos horários fixados;
III – não se ausentar da cidade onde reside, sem autorização judicial;
IV – comparecer a Juízo, para informar e justificar as suas atividades, quando for determinado.