O art. 5º, que trata dos direitos e garantias fundamentais, em seus §§ 2º e 3º, trata dessa proteção estendida para além do ordenamento interno.
Art. 5º (...)
§ 2º Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.
§ 3º Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004.) (Grifos nossos.)
Essa proteção internacional pode ocorrer tanto em âmbito global, em que o responsável pela fiscalização é a Organização das Nações Unidas (ONU), quanto em âmbito regional (sistema interamericano, no caso do Brasil).
Sistema Global (ONU)
Sistema Global de Proteção (ONU): não há um tratado específico que trate da pessoa idosa no âmbito das Nações Unidas. Têm-se declarações, algumas resoluções e documentos que demonstram o tratamento das Nações Unidas à pessoa idosa.
Todavia, nenhum destes documentos é vinculante, todos compõem o que se chama de Soft Law, muito utilizado para as declarações e princípios veiculados que demonstram as diretrizes e o entendimento da organização internacional. Em relação à pessoa idosa, tem-se:
1) Princípios das Nações Unidas em Favor das Pessoas Idosas (Assembleia Geral, 1991).
2) Proclamação do Envelhecimento (Assembleia Geral, 1992).
3) Declaração Política e o Plano de Ação Internacional sobre o Envelhecimento de Madri (Segunda Assembleia Mundial da ONU sobre o Envelhecimento, em Madri, no ano de 2002).
4) O Plano de Ação pedia mudanças de atitudes, políticas e práticas em todos os níveis para satisfazer as enormes potencialidades do envelhecimento no século XXI.
Suas recomendações específicas para ação dão prioridade às pessoas mais velhas e desenvolvimento, melhorando a saúde e o bem-estar na velhice, e assegurando habilitação e ambientes de apoio.
No plano internacional, portanto, tem-se estas diretrizes que delineiam a interpretação das Nações Unidas, mas não são vinculantes, não sendo possível comunicar a um órgão internacional o descumprimento dessas diretrizes e buscar a responsabilidade internacional do Estado brasileiro em virtude disso.
Proteção Internacional e Princípios da Convenção da ONU sobre o Direito dos Idosos
Os direitos humanos objetivam a proteção das pessoas tidas como vulneráveis em face do Estado.
Diante do novo contexto mundial relativo ao envelhecimento dos povos e os desafios que essa realidade traz, é indispensável que o direito internacional se posicione e se organize em termos normativos para fins de proteção dos direitos humanos da pessoa idosa.
A Assembleia Geral da ONU convocou a primeira Assembleia Mundial sobre o Envelhecimento em 1982, que produziu o Plano de Ação Internacional de Viena sobre o Envelhecimento, com 62 pontos.
Ele insta para ação em assuntos como saúde e nutrição, proteção de consumidores idosos, habitação e meio ambiente, família, bem-estar social, segurança de renda e emprego, educação e coleta e análise de dados de pesquisa.
Em 1991, a Assembleia Geral adotou o Princípio das Nações Unidas em Favor das Pessoas Idosas, enumerando 18 direitos das pessoas idosas – em relação a independência, participação, cuidado, autorrealização e dignidade.
No ano seguinte, a Conferência Internacional sobre o Envelhecimento reuniu-se para dar seguimento ao Plano de Ação, adotando a Proclamação do Envelhecimento.
Seguindo a recomendação da Conferência, a Assembleia Geral da ONU declarou 1999 o Ano Internacional do Idoso.
A ação a favor do envelhecimento continuou em 2002, quando a Segunda Assembleia Mundial das Nações Unidas sobre o Envelhecimento foi realizada em Madri.
Objetivando desenvolver uma política internacional para o envelhecimento para o século XXI, a Assembleia adotou uma Declaração Política e o Plano de Ação Internacional sobre o Envelhecimento de Madri.
O Plano de Ação pedia mudanças de atitudes, políticas e práticas em todos os níveis para satisfazer as enormes potencialidades do envelhecimento no século XXI. Suas recomendações específicas para ação dão prioridade às pessoas mais velhas e desenvolvimento, melhorando a saúde e o bem-estar na velhice, e assegurando habilitação e ambientes de apoio.
Convenção Internacional sobre a Proteção dos Direitos Humanos dos Idosos
A Convenção Interamericana sobre a Proteção dos Direitos Humanos dos Idosos, da Organização dos Estados Americanos (OEA), aprovada em junho de 2015, é o primeiro tratado internacional que regulamenta de forma completa e sistemática todos os direitos humanos das pessoas idosas.
Assim, é um documento de suma importância, e sua finalidade é o reconhecimento de que todos os direitos humanos e as liberdades fundamentais existentes se aplicam às pessoas idosas, e que devem gozar plenamente deles em igualdade de condições com os demais.
A Convenção é composta por 41 artigos, e seus sete capítulos tratam, respectivamente, do objetivo, do âmbito de aplicação e definições, dos princípios gerais, dos deveres gerais dos estados-parte, dos direitos protegidos, da tomada de consciência, do mecanismo de acompanhamento da convenção e dos meios de proteção e disposições gerais.
O rol de direitos protegidos é extenso (arts. 5º a 31), e entre eles estão: a igualdade e não discriminação por razões de idade, direito à vida e à dignidade, direito à independência e à autonomia, à participação e integração comunitária, à segurança e a uma vida sem nenhum tipo de violência, direito a não ser submetido à tortura nem a penas ou tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes, direito a manifestar consentimento livre e informado no âmbito da saúde.
Estão previstos, ainda, o direito do idoso que recebe serviços de cuidado de longo prazo, direito à liberdade pessoal, à liberdade de expressão e opinião e acesso à informação, à nacionalidade e à liberdade de circulação, à privacidade e intimidade, à seguridade social, ao trabalho, à saúde, à educação, à cultura, à recreação, lazer e esporte, à propriedade, à moradia, a um meio ambiente saudável, à acessibilidade e à mobilidade pessoal, direitos políticos, direito de reunião e de associação e igual reconhecimento como pessoa perante a lei.
Importante ressaltar que o processo de ratificação dessa convenção ainda não foi finalizado, que se encontra em análise na Câmara dos Deputados sob a forma do Projeto de Decreto Legislativo nº 863/2017.
Princípios da ONU para pessoas idosas (Resolução nº 46/1991)
A Assembleia Geral, no ano de 1991, aprovou os Princípios das Nações Unidas em favor dos idosos, sendo estes princípios referentes aos direitos humanos: independência, participação, assistência, autorrealização e dignidade.
A Resolução nº 46/1991 prevê:
INDEPENDÊNCIA
Ter acesso à alimentação, água, moradia, a vestuário, à saúde, ter apoio familiar e comunitário.
Ter oportunidade de trabalhar ou ter acesso a outras formas de geração de renda.
Poder determinar em que momento deverá afastar-se do mercado de trabalho.
Ter acesso à educação permanente e a programas de qualificação e requalificação profissional.
Poder viver em ambientes seguros adaptáveis à sua preferência pessoal, que sejam passíveis de mudanças.
Poder viver em sua casa pelo tempo que for viável.
PARTICIPAÇÃO
Permanecer integrado à sociedade, participar ativamente na formulação e implementação de políticas que afetam diretamente seu bem-estar e transmitir aos mais jovens conhecimentos e habilidades.
Aproveitar as oportunidades para prestar serviços à comunidade, trabalhando como voluntário, de acordo com seus interesses e capacidades.
Poder formar movimentos ou associações de idosos.
ASSISTÊNCIA
Beneficiar-se da assistência e proteção da família e da comunidade, de acordo com os valores culturais da sociedade.
Ter acesso à assistência da saúde para manter ou adquirir o bem-estar físico, mental e emocional, prevenindo-se da incidência de doenças.
Ter acesso a meios apropriados de atenção institucional que lhe proporcionem proteção, reabilitação, estimulação mental e desenvolvimento social, em um ambiente humano e seguro.
Ter acesso a serviços sociais e jurídicos que lhe assegurem melhores níveis de autonomia, proteção e assistência.
Desfrutar os direitos e liberdades fundamentais, quando residente em instituições que lhe proporcionem os cuidados necessários, respeitando-se sua dignidade, crença e intimidade. Deve desfrutar ainda o direito de tomar decisões quanto à assistência prestada pela instituição e à qualidade de sua vida.
AUTORREALIZAÇÃO
Aproveitar as oportunidades para total desenvolvimento de suas potencialidades.
Ter acesso aos recursos educacionais, culturais, espirituais e de lazer da sociedade.
DIGNIDADE
Poder viver com dignidade e segurança, sem ser objeto de exploração e maus-tratos físicos e/ou mentais.
Ser tratado com justiça, independentemente da idade, sexo, raça, etnia, deficiências, condições econômicas ou outros fatores.
Sistema Regional Interamericano (OEA)
Tem-se alguns documentos com caráter de Soft Law.
1) Declaração de Brasília sobre o Envelhecimento – II Conferência Intergovernamental sobre o Envelhecimento na América Latina e no Caribe, em dezembro de 2007.
2) Convenção Interamericana sobre a Proteção dos Direitos Humanos das Pessoas Idosas (2015) – Trata-se de um tratado internacional no âmbito da OEA que busca proteger os direitos das pessoas idosas. Esta convenção ainda não foi ratificada pelo Estado brasileiro, que já assinou a convenção, porém não passou por todo o processo que é necessário para a incorporação de um documento internacional dentro do ordenamento jurídico brasileiro. Portanto, o Congresso Nacional ainda não deliberou sobre essa convenção, e o presidente da República ainda não ratificou o documento, e tampouco houve a promulgação desse documento dentro do ordenamento jurídico brasileiro, não podendo o país ser compelido a cumprir essas regras, no plano nacional ou internacional. O tratado foi assinado pelo Brasil, mas ainda em processo de ratificação (Projeto de Decreto Legislativo nº 863/2017). Contudo, a assinatura é apenas o primeiro passo; depois é necessária a deliberação parlamentar por meio do Congresso Nacional, posteriormente Executivo precisa ratificar, dando a aceitação definitiva e depositar o documento perante a organização internacional, que é responsável pelo documento; e, por fim, exige-se um decreto executivo dando eficácia ao documento internamente. Dessa maneira, o Brasil parou no primeiro ato, que é a assinatura do tratado.
3) Lei nº 13.646/2018 (Ano de Valorização e Defesa dos Direitos Humanos da Pessoa Idosa) – Apesar de o projeto de decreto legislativo do tratado ainda estar no Congresso Nacional, em 2018 ocorreu a promulgação da Lei nº 13.646/2018, que definiu o ano de valorização e defesa dos direitos humanos da pessoa idosa, promulgada celebrando o processo de ratificação do Estado brasileiro à convenção interamericana sobre os direitos da pessoa idosa. Percebe-se que o Brasil promulgou uma lei celebrando o ano de valorização e defesa dos direitos da pessoa idosa e o processo de ratificação do tratado, enquanto a ratificação de fato do tratado internacional não foi realizada, e é possível que leve um certo tempo.
Quando o Brasil ratificar esse documento internacional, irá demonstrar o compromisso do Estado brasileiro em responder internacionalmente pelo cumprimento dos direitos da pessoa idosa, uma vez que no âmbito da ONU não há esse documento. Dentro da proteção internacional seria um importante passo para que se buscasse a responsabilização internacional por descumprimento de normas relacionadas às pessoas idosas.
Por mais que não haja na ONU um documento internacional específico sobre os idosos, e em relação à Convenção Interamericana sobre a Proteção dos Direitos Humanos das Pessoas Idosas o Brasil ainda não tenha terminado o processo de ratificação e incorporação, é possível que os direitos das pessoas idosas sejam tutelados por outros documentos internacionais de caráter geral, como o pacto internacional dos direitos civis e políticos, dentro do sistema da ONU, ou mesmo a Convenção Americana dos direitos humanos, dentro da OEA, para garantir os direitos das pessoas idosas.
Nesse ponto, uma observação é muito importante: o protocolo de San Salvador, sendo a convenção americana de direitos humanos, que trata dos direitos econômicos, sociais e culturais, e dispõe sobre os direitos da pessoa idosa no art. 17 de seu protocolo adicional, é um documento geral. Entretanto, é interessante relembrar que dentro do protocolo há essa menção expressa aos direitos das pessoas idosas. Portanto, é possível levar-se eventual descumprimento de direitos das pessoas idosas alegando-se violação do protocolo.
Ainda que o Brasil não tenha ratificado a Convenção Interamericana sobre a Proteção dos Direitos Humanos das Pessoas Idosas, é interessante mencionar algumas normas da convenção:
1) O objetivo da Convenção: promover, proteger e assegurar o reconhecimento e o pleno gozo e exercício, em condições de igualdade, de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais do idoso, a fim de contribuir para sua plena inclusão, integração e participação na sociedade.
2) “Idoso”: pessoa com 60 anos ou mais, exceto se a lei interna determinar uma idade base menor ou maior, desde que esta não seja superior a 65 anos. Este conceito inclui, entre outros, o de pessoa idosa.
3) Vetores da Convenção: dignidade, independência, protagonismo e autonomia.
4) Principais direitos: direito à vida digna na velhice, à independência e à autonomia, à participação e integração comunitária, à saúde e ao consentimento livre e informado, à seguridade social, ao trabalho, dentre outros.